1. |
Firme (com Dj Flip)
02:08
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Esquecido, desaparecido em contínuo auto cultivo
Firme, sem vacilo até me porem num asilo
Fiel ao meu espírito, se não sentes, é tranquilo
Mas respeita o desígnio, idealista como o meu signo
Índole invicta nortenha, gema ferrenha
Pronúncia sai da entranha, natural e sem manha
Velha guarda ultrapassada, sem cura, obsoleta
Agarrada a uma cultura e ao conteúdo de uma boa letra
Firmeza! Pedra, cal e viga de aço
Maestro endiabrado neste clássico compasso
Sem embaraço, eu confesso, não trago nada de novo
Isto é rap puro e duro só para meter o real nojo
O real gozo de não fazer o que é suposto
O meu posto é no esgoto a cuspir fogo para o topo
Sou peça fora do jogo, carta fora do baralho
Firme, inconformado, ovelha negra do rebanho
O meu ganho é criativo é tão simples quanto isso
Não te atrevas a questionar o meu nível de compromisso
Este vício é constante por mais que a idade avance
Por mais que eu me desencante e por mais que isto me canse
Eu vou avante com a força que me distingue
Dos demais, sem peso, para combaterem neste ringue
Para onde eles vão, podes crer que eu não vou
E foi cada decisão que definiu o que sou... Firme!
Scratch
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2. |
A decisão (com Dj Flip)
04:17
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A DECISÃO
Refrão:
Sem pressão, sem remuneração
Motivação pura, sem contaminação
Sou voluntário com um diário na mão
Certo ou errado, esta foi a minha decisão
Sejam bem-vindos, eu estou no sítio do costume
No tempero deste vício e com um beat no lume
Naturalmente mais maduro, ainda puro e frontal
O refunda que circula fora da indústria musical
Duas décadas, dedicado a métricas e vocabulário
Sem grandes estéticas, nem plano publicitário
Poeta sem meta material, com matéria espiritual
Altruísmo criativo, sou rico no essencial
Tal e qual a minha origem e raiz
Deixo a música falar por si, foi o que sempre fiz
Nunca quis, sem dúvida, fazer disto vida
O que é sagrado, não deve ser contaminado pela guita
A inspiração com a pressão da remuneração
Perde a sua concepção e transforma-se numa prisão
Pois então, será em vão, este tema em questão?
Acho que não, mas isto é só a minha opinião
Refrão 2x
Scratch
Sou da era dourada, gera do rap de vanguarda
Motivação genuína para criar algo do nada
Partilha desprendida sem contrapartida
Sem pasta à vista, sem conquista ou ambição desmedida
Assumida alergia a qualquer moda que surgia
Rebeldia, originalidade e poesia interventiva
Eu insisto nesta mística, verdade seja dita
Para mim, só assim, a pureza da música é garantida
Revelação pessoal levou à decisão crucial
Pôr esta arte aparte da obrigação salarial
E como tal, eu optei por estudar e trabalhar
Ter a música como espaço para continuar a criar
E se calhar, para ti, é difícil de assimilar
Tens direito a discordar, mas só te resta respeitar
Eu continuo a depositar sinceridade nesta folha
E na verdade, só tenho orgulho e assumo a minha escolha!
Refrão 2x
Têm dito que eu deveria ser mais reconhecido
Agradeço, mas repito, eu não preciso nada disso
Outros dizem que eu devia estar no topo, será gozo?
Esse trono é todo vosso, são sete cães a um osso
O mercado está saturado, o público-alvo é vago
Gado genérico, ecléctico como o tédio da rádio
Eu estou ao lado, liberto para fazer o que quero
Sem adultério no conteúdo, não vendo sumo ao comércio
Não me arrependo, não me lamento, nem sou ingrato e de facto
Obrigado a toda a gente que me tem ajudado
A continuar o legado a que me propus no passado
O apreço é justificado, espero que vos tenha inspirado
Certo ou errado, esta foi a minha decisão
E ainda estou no terreno, pleno de alma e coração
Educativo, clássico, sou do Boom Bap até ao fim
Nem me venham falar de trap, essa merda não é para mim…
Refrão 2x
Scratch
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3. |
A armadilha (com Zulu)
03:25
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Ok, não ando aqui há dois dias
Já vi o rap passar por muitas modas e manias
Esta última, é mais uma e tal como o nome indica
É uma armadilha! Tapa os ouvidos da tua filha…
Dreads batem mal, é só deboche e carnaval
Tuning e bacanal, a ignorância é viral
Patrocinada numa rede social
O rap está a precisar de um controlo parental
É só putas e vinho verde, mas não matam a sede
De quem sente e não se rende meramente a entreter-se
Já percebi o conteúdo, tá tudo, eu faço esse
No meio do fumo, pergunto, qual será o interesse?
Nem com vodka dás moca, então deve ser com coca
Na volta ainda apanho os vícios da tua tropa
Guarda as notas, brocas e garrafas
Eu guardo para outra altura, a abertura das minhas palas
Refrão:
Eles falam que isso é evolução
Se falas mal, levam-te à crucificação
É podridão e como o próprio nome indica
É uma armadilha! É uma armadilha!
Eles falam que isso é evolução,
Se falas mal ronda a crucificação,
Farto dessa estupidificação,
De quem não tem noção de como as merdas são,
Eu, não tenho papas puto, comigo é papo-recto,
Se tu não papas disto, mais vale é estar quieto,
Fazes tudo errado, armado em chico-esperto?!
Só vais gozar a tua fama até bateres no tecto,
Isto é bem certo, hoje és bem aceite,
Amanhã a moda é outra, tu já tens defeito
E assim segues a moda como já tinhas feito
E lá estás tu, contente a escorregar no azeite,
É tudo rei, nesse reino todo o rei é "King Size"
Na verdade não se aproveita um, mas está tudo nice
Onde a estupidez reina, normal, a essência vai-se...
Sonhaste ser um Ice Cube, acabaste um Vanilla Ice.
Refrão 2x
Esse discurso é de um puto no início da puberdade
Para um público inculto, culto em futilidade
Queres ganhar notoriedade com os podres da sociedade?
Essa fama na verdade tem um prazo de validade
Segues o que bate, mas não partes no que fazes
És mais um em auto tune, sem assunto e no disfarce
Dança marioneta, com efeito borboleta
Voa alto e ejecta-te para outro planeta
Mais um single, mais um vídeo, lírico-suicídio
Talvez tenhas o dom do cinema contigo
Essa representação merece um globo de ouro
O olhar sério em slow mo bro, tá um estouro
Parabéns! Tu tens adolescentes reféns
Que um dia vão virar homens a viver com as mães
Com um harém, drogas, a mostrarem notas de cem
Meros produtos do meio e da música que os entretém
Refrão 2x
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4. |
A escola da experiência
04:52
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Maldita e bendita fase da adolescência
Estupidez, aprendizagem e perda da inocência
A inteligência emocional dá os seus primeiros passos
Pouco firmes, muitas quedas perante obstáculos
Metamorfose, transformação, maturação
Acontece a toda a gente e eu não fui excepção
Era desportista, futebolista, federado e dedicado
Noites de 6ª e de sábado, em casa fechado em estágio
Amigos e colegas já rolavam em discotecas
Com a roupinha da moda à procura das primeiras quecas
Eu era demasiado responsável e atinado
Habituado a ver a juventude a passar-me ao lado
Comecei a sair, primeiras bebidas alcoólicas
Primeiras passas, primeiras mocas
Saí da casca, disse basta ao futebol
Verões passaram a ser na rua debaixo da lua e do sol
Ganhei confiança e uma boa auto-estima
Sempre pronto para o engate da próxima rapariga
Freaks ou betinhas, forasteiras ou vizinhas
Com 3 de cada vez, para os meus 3 se porem a milhas
Fiz um grupo de amigos e éramos inseparáveis
Juntos, passamos por momentos únicos, incomparáveis
Mas tudo é incerto e isto é certo como a morte
E quando te sentes mais forte, a vida tira-te o suporte
Doce e amarga fase da adolescência…
Doce e amarga fase da adolescência…
Doce e amarga fase da adolescência…
Intensa aprendizagem, escola da experiência
Montanha russa de emoções, admiráveis sensações
Um mundo novo sem livro de instruções
E de repente sem aviso, quando tudo estava calmo
Lá longe, no horizonte ia-se formando um tornado
E eu cego, nem o via, certo dia apaixonei-me
Mas eu não me conhecia, nem a cama onde deitei-me
Fechei-me numa relação, do ciúme à obsessão
Inseguro, ansioso, a fumá-los como medicação
Auto estima desfeita, sem receita para a cura
Triste e desiludido, eu envolvi-me na amargura
E entretanto, sem prever, eu comecei a perceber
Que a relação dos meus pais não era o que eu julgava ser
O materialismo, a traição, os berros na discussão
A possível separação partiu-me a meio o coração
Eu nem queria acreditar no que o amor se poderia tornar
À minha volta tudo parecia estar a desmoronar
Isolei-me no meu quarto, farto daquele fado
E quando saía, eu tremia e mantinha me calado
Só queria um ouvido amigo para poder desabafar
Mas o grupo com quem parava, não parava de aumentar
Até se tornar num ninho de trafucas e sumíticos
Desconhecidos em fumícios a abafar o vício
Apareceram novas modas, novas drogas
Gulosas, rodas e cocas, mocas perigosas
Amigos do peito viraram perfeitos estranhos
E alguns desapareceram com o decorrer dos anos
Refrão
Depois da cerrada tempestade, lá veio a calma e a bonança
No breu do desespero, há sempre uma réstia de esperança
Nada acontece ao acaso, não duvides, é um facto
A vida ensina-te coisas que não aprendes em nenhum lado
Fiz novos amigos, renovei outros mais antigos
Descobri os benefícios de falar para bons ouvidos
Acalmei-me, equilibrei-me, aprendi a estar sozinho
Um coração não voa alto senão estiver bem no seu ninho
O amor não é perfeito nem tem de ser
Uma relação com alguém só se mantém se a amizade sobreviver
O respeito, a autonomia, a liberdade
Não podes depender de uma pessoa e reclamar felicidade
No final fiquei mais frio, bastante mais selectivo
Nem tudo merecia a minha revolta, muito menos o meu sorriso
Encontrei a minha zona de conforto, totalmente absorto
De quem me fazia sentir meio morto
Nenhuma fase me trouxe tanta paz e tanta guerra
Num momento estava em grande, noutro momento na merda
Mas faz parte, lidar com a adolescência é uma arte
Uma fonte de conhecimento para instruir-te e guiar-te
Estruturar-te, formar-te e definir o teu futuro
Alegre e brilhante ou depressivo e soturno
Eu tomei as decisões e lições, aprendi
Construí convicções e nunca mais as esqueci
Refrão
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5. |
Rectidão (com Dekor)
02:27
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Sou transparente, sincero, sem segundas intenções
A minha face reflecte todas as minhas emoções
Sou amigo do meu amigo, fodido pa quem me fode
Olho por olho, dente por dente é a conduta que me move
Não sou snob, nem arrogante, não obstante
Tenho a noção que por vezes possa ser algo semelhante
Eu não disfarço, tenho esse traço em cada poro
Não sou simpático com quem não suporto
Mas quando gosto, dou tudo aquilo que posso
O meu alcance é simétrico ao teu e sou metódico
Mundo foleiro, cheio de hipocrisia e cinismo
É só rodeio para esconder o antagonismo
Gregos e troianos não se dão, ponto, parágrafo
Agradar a ambos, dás a mão, ficas sem braço
O meu tempo é escasso, a paciência idem aspas
Já manjo ao longe vigaristas e crápulas
A tua cara não engana, tenho algodão à fartazana
A manga é curta, não te estiques com a tua tanga
Esse sorriso é ridículo, o teu abraço não convence
Convence-te que no teatro, o teu talento aparece
Tenho a mais pura rectidão em qualquer relação
Cada um tem o que merece, da minha parte, é prontidão
Protejo a minha outra face, não sou nenhum monge
Inimigos e fingidos? Nah! Quero-vos longe
Rectidão, tento ser correto sou confundido por morcão
Apanhado na teia desprevenido mas já não
Mostro os dentes sou fingido e burlão
Então como estamos qual o ponto de situação
Muita virgem ofendida esses valores andam trocados
Não tenho receio de trabalhar tenho medo de tar encostado
Eu não fui educado para viver à custa de outros
Não bato coros nem vou ficar com os teus louros
Quero o meu canto com os meus verticais como eu
Renego esse fogo de vista porque um dia ardeu
A máscara caiu a mentira fodeu-te
Depois é inocente fala muito educadamente
Tenho bem presente pro que vivo e o sentido
De amizade e bons valores não ando confundido
Se demoro a mexer não é porque desligo
Eu tou aqui para tratar qualquer mal entendido
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6. |
Mastiga, deita fora
04:16
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Refrao 2x
Mastiga, mastiga, deita fora
Aqui nada fica tudo se evapora
A nossa essência é provisória
Mastiga, mastiga, deita fora
Tempos modernos, sentimentos efémeros
Princípios supérfluos, espíritos incompletos
Vidas rolam como murais sem moral
À distância de um click, o teu carácter é sazonal
Inundação de informação em almas sem formação
Mastigam e cospem, sem ponderação nem reflexão
Já nada é profundo, nadamos à superfície
De um qualquer assunto, capas de um livro sem conteúdo
Porque tudo é momentâneo e o que hoje é importante
Amanhã é esquecido e deixa de ser relevante
Tudo é cativante, mas nada é essencial
No fundo somos crianças com uma pose mais formal, tal e qual
Entretidos numa rede social
Convencidos, pseudo peritos em cultura geral
Damos umas pinceladas parvas em qualquer conversa
Mas ver o quadro final, isso já não interessa
Refrao 2x
A busca é incessante pelo prazer imediato
Relações são o prato sujeitas ao nosso escarro
O amor e a amizade são facilmente descartáveis
Ao mínimo obstáculo pulamos para outras margens
Altamente instáveis, pouco fiáveis
Problemas são incontáveis, mas na fuga somos ágeis
Casamentos são divertimentos de adolescente
Divórcio é a palavra que mais se ouve recentemente
Namorados facilmente viram amigos coloridos
E de simples amigos para meros desconhecidos
Idosos que em tempos fizeram tudo pelos filhos
Viram impecilhos, largados em lares pouco dignos
Animais sem estima, com destino ao abandono
O cachorro cresceu e passou a ser um estorvo
Remorsos infelizmente não nos tiram o sono
Esquecemos a merda que somos, amanhã é um dia novo
Refrão 2x
A música em geral está pela hora da morte
Toda a gente a consome, mas ninguém a absorve
Já não se escuta nada com a calma necessária
Ela tornou-se plástica, tipo comida rápida
Mastiga, deita fora, a reacção é inglória
3 minutos de atenção e já passaste à história
3 mil músicas num dispositivo portátil
3 segundos em cada uma, tipo viciados em zapping
Não passamos de virtuais coleccionadores
Raptores em downloads sem respeito por criadores
Memória cheia nos computadores enquanto a nossa está vazia
Défice de atenção, mente hiperactiva
Nós queremos tudo, mas, no fundo, nada temos
Porque, em nada, realmente nos envolvemos
São os tempos que correm à velocidade de um sprint
Ainda me estás a ouvir ou já passaste pá seguinte
Refrão 2x
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7. |
Beber um copo
05:38
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6a feira, fim da tarde e eu cansado de trabalhar
Tinha feito tantos kms, nem me apetecia levantar
O telefone começa a tocar, é o Cake a ligar
Com a típica e normal proposta para jantar
"É em casa do Sérgio, vai lá a maltinha toda
Traz um vinho jeitoso para fazermos a real boda"
“Combinado!” Escolho o vinho, pego no carro
E no caminho a pensar: "Vou ficar num lindo estado!"
Mal chego, as minis já rolam como aperitivo
Cheira a tarolo, tiro duas, já me sinto mais tranquilo
Mais 3 ou 4 cucas, os olhos ficam em bico
O jantar tá na mesa e o vinho é convidativo
Conversa puxa conversa, copo puxa copo
Molho a palavra para discutir o próximo tópico
Política, educação, economia e sociedade
Já sinto o soro da verdade a falar com intensidade
Sobremesas? Não! Sou amigo do digestivo
O Sérgio sabe disso e tem uma garrafa sem logótipo
"Este é do lavrador, de Santa Cona do Assobio"
“Ui! Chega me já um balão que eu chamo lhe já um figo”
A conversa anima, a gargalhada já é bem-vinda
E já sinto dificuldades na locomoção da minha língua
2 da manhã, a boa disposição já me governa
Mas sigo para ir embora, tenho a mulher à espera
Refrão 2x:
Se vais beber um copo, para quê levar o bote?
Eles andam à caça, tens pasta em stock?
Não vale a pena, pois a pena é pesada
Faz te ao passeio, não te faças à estrada
"Ei ó Nocas tem cuidado, tas fixe para levar o carro?"
“Tá descansado, que eu manjo onde é que a moina tem parado
Já faço isto há 10 anos e nunca fui apanhado
Até logo, valeu! Fiquem bem e obrigado”
Desço o prédio rápido, conduzir tocado, eu adoro
Desço as janelas ao máximo, cigarro e sonoro
Sigo tranquilo, as rimas que ouço, sei decor
Mas distraído, viro para uma rua que não é a melhor
A minha alma congela, a minha cara fica pálida
A 100 metros tenho a polícia com um corte na estrada
Eu nem reajo, o moina já me faz sinais como um louco
“Tranquilo, vamos lá, que isto deve acusar pouco”
Paro o carro, o nervosismo abana me como um sismo
Sinto a moca no seu pico, penso pra mim, “tou fodido”
Saio a cambalear, o moina já se tá a grizar
"Boa noite sr condutor, vamos ali soprar?"
A caminho do balão eu ponho me a pensar
“Fodasse, vou ser despedido, preciso da carta para trabalhar”
1o sopro com receio para atenuar o rastreio
"Ó Sr Tiago isto tem que ser feito com o pulmão cheio"
2 vez, sem frete faço aquilo que me compete
Na máquina aparece 1.97
“Deixe aí o seu carro, vem connosco para a esquadra”
Cai me tudo num segundo, a minha vida está desgraçada
Refrão 2x
Já no ninho da bófia, eu não consigo encontrar forma
Da minha mente ficar sóbria, a puta da língua só se enrola
Eles preenchem a papelada, eu já nem digo nada
Vou mas é ligar ao Paulinho para ver se ele me leva a casa
"Fodasse ó Nocas eu já te tinha avisado"
“Pois eu sei bro, para a próxima não hesites, dá me um estalo”
Mal desligo, dão me a convocatória pó tribunal
"2a feira apresente se lá e tente ser pontual"
“Ó sr guarda, o que acha? Acha que ainda me safo?”
"Ó Sr Tiago, isso depende do juiz que trate do seu caso
Refira que precisa da carta pó seu trabalho
Pode ser que fique com ela e que seja só multado"
Fim-de-semana estranho, um autêntico pesadelo
Dominado pela depressão, ansiedade e o medo
Qual seria a decisão do juiz?
O meu patrão perdoaria esta merda que eu fiz?
2a feira no tribunal, aproxima se uma senhora
Doutora juíza com aspecto de professora
“Bom dia Sr. Tiago, isto tá complicado
Já sei que necessita da carta pó seu trabalho
Mas o seu nível de álcool era demasiado elevado
Por isso durante 3 meses não pode andar encartado”
Um arrepio percorre-me a espinha e nem avisa
Suores frios, quase desmaio à frente da juíza
“Agora, preciso que você tome aqui uma decisão
Pagar 500 euros é a primeira opção
Ou então faz uma doação de metade a uma instituição
E participa semanalmente num curso de formação”
Escolho a segunda, saio estarrecido e sem chão
Vou pó trabalho, de autocarro, para falar com o meu patrão
Chego ao seu gabinete e conto-lhe o sucedido
Mas no final da conversa, ele parece me tranquilo
“Não te preocupes Tiago, eu já passei por isso
Precisas de um motorista para andar sempre contigo”
Chama o rapaz do armazém e explica-lhe a situação
E este todo contente com a sua nova função
Em jeito de conclusão e a partir desse dia
Tomei uma decisão que até hoje tento seguir à risca
Se for para sair, conviver e beber
Vou de autocarro, de táxi ou ponho os pés a mexer
Refrão 2x
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8. |
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1867, data do seu berço
Um livro controverso catalisou o seu começo
Contexto temporal, pós revolução industrial
Crescimento exponencial da desigualdade social
Êxodo rural, concentração populacional
Miséria salarial, exploração laboral
Ela foi o santo graal para milhões de oprimidos
Analfabetos submissos, pelo trabalho embrutecidos
Nela viram um motivo para sonhar e acreditar
Que era possível alcançar uma sociedade exemplar
Irredutível na defesa da dignidade humana
Onde a procura da felicidade se tornaria soberana
A mais pura esperança nos olhos de uma criança
Por não ver o seu futuro trespassado pela ganância
A natural ânsia por equidade e justiça
Essencialmente espiritual, ela vai além da política
Ainda está presente em quem a sente
Gente altruísta, benevolente, com o bem comum em mente
Cooperação, entre ajuda
Dar tudo pelo próximo mesmo que a relação não seja mútua
Nobre conduta de luta e resistência
Perante a avareza, a tendência egocêntrica
Do capitalismo, a sobrevivência do mais forte
Ela é o suporte dum cidadão abandonado à sua sorte
A luz no fundo do túnel, por trás da locomotiva
Ela não é individualista, a sua mística é colectiva
Sem a ridícula obsessão materialista
Proporcionar o essencial de uma forma gratuita
Saúde, educação, habitação e energia
Devolvidas a quem cultiva as sementes da economia
Tu imagina o que seria um outro modo de vida
Se a diária subsistência já estivesse garantida
Mas ela foi difamada, apelidada de utopia
Raptada por ditaduras com a sua simbologia
Envenenada pela cobiça e oportunismo
Gente sem o mínimo sentido de compaixão e humanismo
E assim chegamos a isto, somos plástico no lixo
Talvez seja um eufemismo, mas é aquilo que eu sinto
Cegos, entretidos, à espera do paraíso
Num inferno sem progresso e desprovido de espírito
Refão 2x
Tempos sombrios, o egoísmo governa
A simbiose fraterna perdeu-se nesta nova era
Cada um por si, sem compaixão nem empatia
É o resultado de uma esquerda esquecida
Spoken word:
Sim filho…palavras sábias as tuas
Tu és meu filho
Mas eu…Sou o filho órfão
De uma liberdade conquistada
Que não serviu de nada
Eu sou o filho órfão
De uma esquerda esquecida
Que não me deu a vida
Não sou homem de qualquer fé
E renego a falta de paixão
Eu pertenço aos que vivem de pé
E não aos de joelhos no chão
Sou o irmão solidário
Dos que fazem esse futuro
Do viver e do ar mais puro
Mas sou o pai confiante
De uma orgulhosa herança
Onde deposito toda a esperança
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9. |
Bater no ceguinho
03:52
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Como sempre e desde sempre tudo tende a degradar-se
O rap luso adaptou-se às regras da sociedade
Virou tuga, virou thug, virou guna no desenrasque
E como a pasta entrou em jogo, todos querem a sua parte
Sacrificou-se a arte, a criatividade
A originalidade pela tendência que mais bate
Lentamente isto vai ficando vazio, sem conteúdo
Sinceramente, com aquilo que ouço, mais vale um gajo ficar surdo
Anda tudo com a auto estima muito em cima
Será impressão minha ou isso cheira-me a cocaína
Pimps e players, dealers e playboys
A enaltecerem grandes fezadas, negócios e constróis
Cowboys, heróis armados em machões
Com ambições de grandes carros e danças em varões
É só imitações e o sucesso é garantido
Mas o discurso é tão baixo que eu tenho que ficar fodido
Refrao 2x:
O conteúdo anda uma bosta, mas quem é que se importa
Do mais novo ao mais cota, anda tudo atrás da nota
Sinto a revolta, mas na volta estou sozinho
Diz-me lá, ando a bater no ceguinho?
Mais um rapper que ficou rico, outro que tenciona sê-lo
Quem não os sente por algum motivo, é porque tem dor de cotovelo
A sério? Que degredo, nem tudo anda atrás do mesmo
Há quem ainda faça isto só pelo prazer em fazê-lo
Será que colaste um selo? Não tens mai nada para falar
Ok, já percebi adoras beber e fumar
Eles põem me com medo, são uns ases no engate
Se calhar é melhor fechar a minha mulher a 7 chaves
Mais um hit para a street mas estão em casa no Facebook
Só saem pó videoclip com o outfit e cara de rude
São um êxito no YouTube, mas o conteúdo tá muito aquém
“Rest in piças” às pitas adolescentes que te seguem
Como te falta sumo, viraste pró nos adlibs
Tá tudo, mas isso aqui não passam de paneleirices
É só fogo-de-artifício, a mensagem tá na miséria
Esquecida, boicotada e a ignorância prolifera
Refrão 2x
O rap interventivo está em coma induzido
Agora parece proibido deixar um ouvinte pensativo
Eles querem-te submisso, entretido e morto-vivo
Carneiro do materialismo sem um estímulo cognitivo
Isto anda fodido e não é de agora
Desde que virou moda, pouca gera da minha era o suporta
O que era praticamente uma terapia de auto-ajuda
Virou mera prescrição de medicação na consulta
Eles agora são meros actores com um guião
Com uma fórmula estereotipada sem imaginação
Enchem linham com chouriços, dão enfoque no refrão
Cheio de feitos para agradar o ouvido da multidão
Eles estão numas de expansão e o tema é recorrente
Desejo-te tudo de bom desde que dês algo prá mente
A vida é muito mais do que festas, mocas e pasta
Esse paleio sem conteúdo não sacia a minha traça
Refrão 4x
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10. |
Paternidade
04:10
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Nada na verdade se compara à paternidade
A emoção, a angústia, a responsabilidade
A vida muda, sem dúvida a partir do momento
Que tens um rebento a precisar do teu amor e sustento
O nascimento é algo mágico, divino, sobrenatural
Segurar nos braços um recém-nascido? Não há igual
E é aqui que tudo se altera porque nada supera
Esta quimera de ver uma vida na sua bela Primavera
A crescer, a florescer, cada dia é uma novidade
O sorrir, o palrar, o gargalhar com espontaneidade
A primeira palavra, o primeiro raciocínio
O fascínio de cada degrau num processo contínuo
Os primeiros passos e galos consequentes
Desenvolver um sexto sentido para evitar acidentes
O descanso é raro num quotidiano rotineiro
Isto não é um passatempo, é um ofício a tempo inteiro
Refrao 2x:
Não há nada como ser pai, o sentimento é mágico
Aproveita cada momento pois o tempo passa rápido
Apesar do cansaço, todo o esforço vale a pena
A presença de uma criança na tua vida é recompensa
As fraldas, o leite, a chupeta, as cólicas
A creche, os medos, a comida, o deitar cedo
O choro, as birras, o sono, os pesadelos
As quinas, as quedas, as negras, os brinquedos
Há quem diga que os filhos dão novo alento a uma relação
Tá bem... Diz me lá onde é que tu viste isso então
Com uma prole e um horário de trabalho de sol a sol
É natural que o novelo da paixão não desenrole
Tão facilmente como antigamente, a chama não se acende?
Tem calma! É o cansaço que te deixa impaciente
Talvez mais intolerante mas tudo tem o seu tempo
E se filhos são prioridade, aproveita este momento
O sentimento de exaustão faz parte, não há escape
Tens a obrigação de lhes dar a tua vitalidade
Noites mal dormidas, caos nas refeições
Conforma te porque para isso não existem soluções
E apesar do desgaste, isto vale bem a pena
Se este milagre da vida te cumprimenta, então acena
De volta, porque eles crescem e ficas descansado
É treta, filhos criados, trabalhos dobrados
Refrão 2x
As fraldas, o leite, a chupeta, as cólicas
A creche, os medos, a comida, o deitar cedo
O choro, as birras, o sono, os pesadelos
As quinas, as quedas, as negras, os brinquedos
Educar uma criança tem tanto que se lhe diga
A incerteza da melhor conduta é a constante que nos pisa
Qual é o ponto em que os mimos deixam de ter benefícios?
E devemos passar a ser severos e assertivos
Uma criança é junção de genética e educação
O comportamento não cai do céu, é reacção da tua acção
Este é o verdadeiro peso da responsabilidade
Que nos dá brancas e rugas em tão tenra idade
Mas na verdade, a vida ganha outra cor, outro sabor
Só quem é progenitor sente a intensidade deste amor
Entrega completa e sincera de corpo e alma
Sem pausa, nem ressalvas e sem salva de palmas
Coração aberto e um caminho concreto
Dar tudo pelos filhos porque já nem eu próprio interesso
Quando és pai, o egocentrismo deixa de ter sentido
E qualquer sacrifício é feito por um justo motivo
Refrão 2x
As fraldas, o leite, a chupeta, as cólicas
A creche, os medos, a comida, o deitar cedo
O choro, as birras, o sono, os pesadelos
As quinas, as quedas, as negras, os brinquedos
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11. |
Estado Privado
02:56
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Muito bom dia. Quê? Muito bom dia o caralho
Eu estou fodido e mal pago, em pânico, angustiado
Eu vivo no futuro, em 2054
Onde já nada é público, tudo passou a ser privado
Trabalho como um escravo sem direitos nem contrato
Com um sistema de produção quase todo robotizado
Tenho andado preocupado, corre um boato lá na fábrica
“Ouvi dizer que o patrão quer comprar mais uma máquina”
Estou casado, cachopo com seis anos na escola
E uma propina que quase me põe a pedir esmola
A minha mulher trabalha atrás de uma secretária
Até aqui menos mal, mas ela encontra-se grávida
38 semanas, já começaram as contracções
Mais um filho para alimentar e eu sem condições!
Eu disse filho? Nem sei se é menino ou menina
Nem guita tive para nenhuma consulta de obstetrícia
Será que é saudável? Posso-lhe dar conforto?
Eu queria, mas não havia pasta para um aborto
As contracções aceleram, siga pá maternidade
Eu vou pó trabalho ou sou despedido por falta de assiduidade
Só que a maternidade é mais cara do que um hotel
Ambulância, parto, estadia... Eu preciso de papel
Vou ligar pó banco, vou pedir um financiamento
Se ela for pa cesariana ou se ficar lá muito tempo
Deixo o puto na escola e mal chego ao trabalho
No cacifo, um recado, reunião com o patronato
A caminho, reparo, no meu espaço há um reboliço
É a nova geringonça a fazer o meu serviço
Tou fodido, sigo pá reunião com cara de derrotado
O gerente com paleio de saco e discurso ensaiado
Reestruturação na empresa, cortes na produção
Sou dispensado com frieza sem qualquer compensação
É que nos tempos que correm já não há subsídios
Trabalhadores são despedidos com direito ao suicídio
Chamada no telefone, é da escola do meu filho
Sinais de gastroenterite, sigo em seu auxílio
Chego lá “fodasse, o puto tá mesmo mal”
Eu sou aconselhado a dirigir-me a um hospital
Ok, tá mais que visto que eu hoje vou à falência
Nova chamada no telefone mal chego à urgência
A minha mulher, diz que a situação tá complicada
Tem que ir pa cesariana pois a bebé tá sentada
“O quê? É uma menina? Mas que boa notícia!”
Por momentos até me esqueço de quanto custa a cirurgia
O meu filho é atendido e o remédio é prescrito
Consulta paga, conta passa logo a negativo
Tou literalmente fodido, o que é que hei de fazer?
Amanhã nem pasta para fraldas eu vou ter
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12. |
Dedicatória (com Able)
03:14
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Tu és a minha heroína, sempre foste e sempre serás
Mãe galinha, anjo da guarda, nem preciso de olhar para trás
Eu sei que estarás lá para aquilo que for preciso
Com um sorriso digo que tenho orgulho em ser o teu único filho
Tu és o meu alicerce, a minha tábua de salvação
Foi notável a tua dedicação na minha evolução
Amor incondicional, exigente na educação
Terra-a-terra, simples e laica de profunda convicção
Alimentaste o meu coração de respeito pelo próximo
Seja ele rico ou pobre, o carácter não vem com rótulo
Origem humilde, de onde se sobrevive
Sempre grato porque nunca tiveste tudo aquilo que eu tive
Sempre fui na realidade a tua prioridade
Mas além do conforto, deste me responsabilidade
Fidelidade no amor e na amizade
Capacidade de lutar por quem nos ama de verdade
Refrão 2x:
Este olhar que eu trago é reflexo de ti
Vivo a dar o que deste porque eu não me esqueci
E se o fardo vier, eu só paro no fim
Não vou a nenhum lado, vê se esperas por mim
Tu és o meu herói, sempre foste e sempre serás
Pai dedicado, inteligente e perspicaz
Eterno motor de busca de conhecimento e cultura
Apresentaste-me bem cedo a música e literatura
Teatro, cinema, sempre foste um erudito
Ensinaste-me que é na arte que se cultiva o espírito
Tu estás a ver o que o teu filho está a fazer?
Aquela poesia que sempre gostaste de escrever
Sou o teu legado, acho que podes estar descansado
Inconformismo na sociedade e empenho no trabalho
O gosto pelo desporto, a alquimia da forma física
Somos fotocópia genética nos gestos e na mímica
Nos últimos 15 anos, tens andado emigrado
Não há palavras que descrevam o quanto te tens sacrificado
Mas apesar da distância, tu manténs-te chegado
A preencher este vazio que nos tem assombrado
Refrão 3x
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13. |
Improvável e atípico
04:23
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A caminho dos 40, quem é que ainda me aguenta?
A maioria desses ouvintes ainda estão na placenta
Mantenho a relevância? Tocarei na tua essência?
O que digo tem importância? Ou sou mais um sem audiência
Estarei a perder o meu tempo? Vale a pena continuar?
Entre o trabalho e a família, talvez eu deva sossegar
Acalmar, desfrutar da vida sem pensar tanto
Sem questionar tanta coisa e permanecer no meu canto
Mas não! Ainda tenho alento e coração
Continuo com algo a dizer mesmo sem aprovação
O tempo é restrito mas eu cá me desenrasco
Tenho um pacto com isto e persisto em honrá-lo
A tua opinião é brisa na minha cortina de aço
Não mudo os meus princípios porque a música tem mudado
Aquilo que me move não são as modas do mercado
Quando partir, talvez me consideres um achado
Refrão 2x:
Ainda devo fazer isto? Estarei ultrapassado?
Talvez, mas esta música deixa-me viciado
Viver por viver, sem rimar não faz sentido
Eu continuo aqui, improvável e atípico
3/4 da minha geração já não fazem som
Eu questiono, eles afirmam que já não têm inspiração
Que já não têm tempo, vontade ou motivação
E eu penso, afinal como é que eu me aguento aqui então?
Devo seguir o exemplo? Já que isto não dá sustento?
E quando quase ninguém anda nisto pelo sentimento?
Será que isto que faço pertencerá ao passado?
E como passado que seja, devo arruma lo no armário?
Não! A música faz parte de mim
Eu sinto me mais no início do que propriamente no fim
A idade não é um posto, muito menos um obstáculo
Eu provo isso todos os dias a quem me disser o contrário
Estou motivado, ainda mais do que quando era chavalo
Na verdade, a maturidade só me tem ajudado
Vidrado no ritmo, viciado na poesia
Deixar isto abandonado? Ainda há-de chegar o dia
Refrão 2x
Tá mais que visto e revisto que eu não me identifico
Com certas tendências que a maioria tem seguido
Será que não me actualizo tipo sistema operativo?
Serei velho do Restelo anti tudo que seja progressivo?
Andarei realmente só a bater no ceguinho?
Será que o rap ganhou asas e eu, à procura do ninho?
Será que o conteúdo consciente perdeu se no seu caminho?
Será que estarei nesta luta realmente sozinho?
Não! Eu sei que não! Ainda há gente boa de ouvido
Aquela minoria do costume que está aqui desde o início
É para vocês que eu rimo, aqueles que sentem o que eu sinto
É não se deixam hipnotizar por algo que só tem brilho
O trajecto do progresso às vezes tem retrocesso
E nem tudo o que é novo nos traz algo de concreto
Eu continuo fiel àquilo que me apaixonei
Mensagem pura e Boom Bap tal como manda a lei
Refrão 2x
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