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Firme

by Infinito

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1.
Esquecido, desaparecido em contínuo auto cultivo Firme, sem vacilo até me porem num asilo Fiel ao meu espírito, se não sentes, é tranquilo Mas respeita o desígnio, idealista como o meu signo Índole invicta nortenha, gema ferrenha Pronúncia sai da entranha, natural e sem manha Velha guarda ultrapassada, sem cura, obsoleta Agarrada a uma cultura e ao conteúdo de uma boa letra Firmeza! Pedra, cal e viga de aço Maestro endiabrado neste clássico compasso Sem embaraço, eu confesso, não trago nada de novo Isto é rap puro e duro só para meter o real nojo O real gozo de não fazer o que é suposto O meu posto é no esgoto a cuspir fogo para o topo Sou peça fora do jogo, carta fora do baralho Firme, inconformado, ovelha negra do rebanho O meu ganho é criativo é tão simples quanto isso Não te atrevas a questionar o meu nível de compromisso Este vício é constante por mais que a idade avance Por mais que eu me desencante e por mais que isto me canse Eu vou avante com a força que me distingue Dos demais, sem peso, para combaterem neste ringue Para onde eles vão, podes crer que eu não vou E foi cada decisão que definiu o que sou... Firme! Scratch
2.
A DECISÃO Refrão: Sem pressão, sem remuneração Motivação pura, sem contaminação Sou voluntário com um diário na mão Certo ou errado, esta foi a minha decisão Sejam bem-vindos, eu estou no sítio do costume No tempero deste vício e com um beat no lume Naturalmente mais maduro, ainda puro e frontal O refunda que circula fora da indústria musical Duas décadas, dedicado a métricas e vocabulário Sem grandes estéticas, nem plano publicitário Poeta sem meta material, com matéria espiritual Altruísmo criativo, sou rico no essencial Tal e qual a minha origem e raiz Deixo a música falar por si, foi o que sempre fiz Nunca quis, sem dúvida, fazer disto vida O que é sagrado, não deve ser contaminado pela guita A inspiração com a pressão da remuneração Perde a sua concepção e transforma-se numa prisão Pois então, será em vão, este tema em questão? Acho que não, mas isto é só a minha opinião Refrão 2x Scratch Sou da era dourada, gera do rap de vanguarda Motivação genuína para criar algo do nada Partilha desprendida sem contrapartida Sem pasta à vista, sem conquista ou ambição desmedida Assumida alergia a qualquer moda que surgia Rebeldia, originalidade e poesia interventiva Eu insisto nesta mística, verdade seja dita Para mim, só assim, a pureza da música é garantida Revelação pessoal levou à decisão crucial Pôr esta arte aparte da obrigação salarial E como tal, eu optei por estudar e trabalhar Ter a música como espaço para continuar a criar E se calhar, para ti, é difícil de assimilar Tens direito a discordar, mas só te resta respeitar Eu continuo a depositar sinceridade nesta folha E na verdade, só tenho orgulho e assumo a minha escolha! Refrão 2x Têm dito que eu deveria ser mais reconhecido Agradeço, mas repito, eu não preciso nada disso Outros dizem que eu devia estar no topo, será gozo? Esse trono é todo vosso, são sete cães a um osso O mercado está saturado, o público-alvo é vago Gado genérico, ecléctico como o tédio da rádio Eu estou ao lado, liberto para fazer o que quero Sem adultério no conteúdo, não vendo sumo ao comércio Não me arrependo, não me lamento, nem sou ingrato e de facto Obrigado a toda a gente que me tem ajudado A continuar o legado a que me propus no passado O apreço é justificado, espero que vos tenha inspirado Certo ou errado, esta foi a minha decisão E ainda estou no terreno, pleno de alma e coração Educativo, clássico, sou do Boom Bap até ao fim Nem me venham falar de trap, essa merda não é para mim… Refrão 2x Scratch
3.
Ok, não ando aqui há dois dias Já vi o rap passar por muitas modas e manias Esta última, é mais uma e tal como o nome indica É uma armadilha! Tapa os ouvidos da tua filha… Dreads batem mal, é só deboche e carnaval Tuning e bacanal, a ignorância é viral Patrocinada numa rede social O rap está a precisar de um controlo parental É só putas e vinho verde, mas não matam a sede De quem sente e não se rende meramente a entreter-se Já percebi o conteúdo, tá tudo, eu faço esse No meio do fumo, pergunto, qual será o interesse? Nem com vodka dás moca, então deve ser com coca Na volta ainda apanho os vícios da tua tropa Guarda as notas, brocas e garrafas Eu guardo para outra altura, a abertura das minhas palas Refrão: Eles falam que isso é evolução Se falas mal, levam-te à crucificação É podridão e como o próprio nome indica É uma armadilha! É uma armadilha! Eles falam que isso é evolução, Se falas mal ronda a crucificação, Farto dessa estupidificação, De quem não tem noção de como as merdas são, Eu, não tenho papas puto, comigo é papo-recto, Se tu não papas disto, mais vale é estar quieto, Fazes tudo errado, armado em chico-esperto?! Só vais gozar a tua fama até bateres no tecto, Isto é bem certo, hoje és bem aceite, Amanhã a moda é outra, tu já tens defeito E assim segues a moda como já tinhas feito E lá estás tu, contente a escorregar no azeite, É tudo rei, nesse reino todo o rei é "King Size" Na verdade não se aproveita um, mas está tudo nice Onde a estupidez reina, normal, a essência vai-se... Sonhaste ser um Ice Cube, acabaste um Vanilla Ice. Refrão 2x Esse discurso é de um puto no início da puberdade Para um público inculto, culto em futilidade Queres ganhar notoriedade com os podres da sociedade? Essa fama na verdade tem um prazo de validade Segues o que bate, mas não partes no que fazes És mais um em auto tune, sem assunto e no disfarce Dança marioneta, com efeito borboleta Voa alto e ejecta-te para outro planeta Mais um single, mais um vídeo, lírico-suicídio Talvez tenhas o dom do cinema contigo Essa representação merece um globo de ouro O olhar sério em slow mo bro, tá um estouro Parabéns! Tu tens adolescentes reféns Que um dia vão virar homens a viver com as mães Com um harém, drogas, a mostrarem notas de cem Meros produtos do meio e da música que os entretém Refrão 2x
4.
Maldita e bendita fase da adolescência Estupidez, aprendizagem e perda da inocência A inteligência emocional dá os seus primeiros passos Pouco firmes, muitas quedas perante obstáculos Metamorfose, transformação, maturação Acontece a toda a gente e eu não fui excepção Era desportista, futebolista, federado e dedicado Noites de 6ª e de sábado, em casa fechado em estágio Amigos e colegas já rolavam em discotecas Com a roupinha da moda à procura das primeiras quecas Eu era demasiado responsável e atinado Habituado a ver a juventude a passar-me ao lado Comecei a sair, primeiras bebidas alcoólicas Primeiras passas, primeiras mocas Saí da casca, disse basta ao futebol Verões passaram a ser na rua debaixo da lua e do sol Ganhei confiança e uma boa auto-estima Sempre pronto para o engate da próxima rapariga Freaks ou betinhas, forasteiras ou vizinhas Com 3 de cada vez, para os meus 3 se porem a milhas Fiz um grupo de amigos e éramos inseparáveis Juntos, passamos por momentos únicos, incomparáveis Mas tudo é incerto e isto é certo como a morte E quando te sentes mais forte, a vida tira-te o suporte Doce e amarga fase da adolescência… Doce e amarga fase da adolescência… Doce e amarga fase da adolescência… Intensa aprendizagem, escola da experiência Montanha russa de emoções, admiráveis sensações Um mundo novo sem livro de instruções E de repente sem aviso, quando tudo estava calmo Lá longe, no horizonte ia-se formando um tornado E eu cego, nem o via, certo dia apaixonei-me Mas eu não me conhecia, nem a cama onde deitei-me Fechei-me numa relação, do ciúme à obsessão Inseguro, ansioso, a fumá-los como medicação Auto estima desfeita, sem receita para a cura Triste e desiludido, eu envolvi-me na amargura E entretanto, sem prever, eu comecei a perceber Que a relação dos meus pais não era o que eu julgava ser O materialismo, a traição, os berros na discussão A possível separação partiu-me a meio o coração Eu nem queria acreditar no que o amor se poderia tornar À minha volta tudo parecia estar a desmoronar Isolei-me no meu quarto, farto daquele fado E quando saía, eu tremia e mantinha me calado Só queria um ouvido amigo para poder desabafar Mas o grupo com quem parava, não parava de aumentar Até se tornar num ninho de trafucas e sumíticos Desconhecidos em fumícios a abafar o vício Apareceram novas modas, novas drogas Gulosas, rodas e cocas, mocas perigosas Amigos do peito viraram perfeitos estranhos E alguns desapareceram com o decorrer dos anos Refrão Depois da cerrada tempestade, lá veio a calma e a bonança No breu do desespero, há sempre uma réstia de esperança Nada acontece ao acaso, não duvides, é um facto A vida ensina-te coisas que não aprendes em nenhum lado Fiz novos amigos, renovei outros mais antigos Descobri os benefícios de falar para bons ouvidos Acalmei-me, equilibrei-me, aprendi a estar sozinho Um coração não voa alto senão estiver bem no seu ninho O amor não é perfeito nem tem de ser Uma relação com alguém só se mantém se a amizade sobreviver O respeito, a autonomia, a liberdade Não podes depender de uma pessoa e reclamar felicidade No final fiquei mais frio, bastante mais selectivo Nem tudo merecia a minha revolta, muito menos o meu sorriso Encontrei a minha zona de conforto, totalmente absorto De quem me fazia sentir meio morto Nenhuma fase me trouxe tanta paz e tanta guerra Num momento estava em grande, noutro momento na merda Mas faz parte, lidar com a adolescência é uma arte Uma fonte de conhecimento para instruir-te e guiar-te Estruturar-te, formar-te e definir o teu futuro Alegre e brilhante ou depressivo e soturno Eu tomei as decisões e lições, aprendi Construí convicções e nunca mais as esqueci Refrão
5.
Sou transparente, sincero, sem segundas intenções A minha face reflecte todas as minhas emoções Sou amigo do meu amigo, fodido pa quem me fode Olho por olho, dente por dente é a conduta que me move Não sou snob, nem arrogante, não obstante Tenho a noção que por vezes possa ser algo semelhante Eu não disfarço, tenho esse traço em cada poro Não sou simpático com quem não suporto Mas quando gosto, dou tudo aquilo que posso O meu alcance é simétrico ao teu e sou metódico Mundo foleiro, cheio de hipocrisia e cinismo É só rodeio para esconder o antagonismo Gregos e troianos não se dão, ponto, parágrafo Agradar a ambos, dás a mão, ficas sem braço O meu tempo é escasso, a paciência idem aspas Já manjo ao longe vigaristas e crápulas A tua cara não engana, tenho algodão à fartazana A manga é curta, não te estiques com a tua tanga Esse sorriso é ridículo, o teu abraço não convence Convence-te que no teatro, o teu talento aparece Tenho a mais pura rectidão em qualquer relação Cada um tem o que merece, da minha parte, é prontidão Protejo a minha outra face, não sou nenhum monge Inimigos e fingidos? Nah! Quero-vos longe Rectidão, tento ser correto sou confundido por morcão Apanhado na teia desprevenido mas já não Mostro os dentes sou fingido e burlão Então como estamos qual o ponto de situação Muita virgem ofendida esses valores andam trocados Não tenho receio de trabalhar tenho medo de tar encostado Eu não fui educado para viver à custa de outros Não bato coros nem vou ficar com os teus louros Quero o meu canto com os meus verticais como eu Renego esse fogo de vista porque um dia ardeu A máscara caiu a mentira fodeu-te Depois é inocente fala muito educadamente Tenho bem presente pro que vivo e o sentido De amizade e bons valores não ando confundido Se demoro a mexer não é porque desligo Eu tou aqui para tratar qualquer mal entendido
6.
Refrao 2x Mastiga, mastiga, deita fora Aqui nada fica tudo se evapora A nossa essência é provisória Mastiga, mastiga, deita fora Tempos modernos, sentimentos efémeros Princípios supérfluos, espíritos incompletos Vidas rolam como murais sem moral À distância de um click, o teu carácter é sazonal Inundação de informação em almas sem formação Mastigam e cospem, sem ponderação nem reflexão Já nada é profundo, nadamos à superfície De um qualquer assunto, capas de um livro sem conteúdo Porque tudo é momentâneo e o que hoje é importante Amanhã é esquecido e deixa de ser relevante Tudo é cativante, mas nada é essencial No fundo somos crianças com uma pose mais formal, tal e qual Entretidos numa rede social Convencidos, pseudo peritos em cultura geral Damos umas pinceladas parvas em qualquer conversa Mas ver o quadro final, isso já não interessa Refrao 2x A busca é incessante pelo prazer imediato Relações são o prato sujeitas ao nosso escarro O amor e a amizade são facilmente descartáveis Ao mínimo obstáculo pulamos para outras margens Altamente instáveis, pouco fiáveis Problemas são incontáveis, mas na fuga somos ágeis Casamentos são divertimentos de adolescente Divórcio é a palavra que mais se ouve recentemente Namorados facilmente viram amigos coloridos E de simples amigos para meros desconhecidos Idosos que em tempos fizeram tudo pelos filhos Viram impecilhos, largados em lares pouco dignos Animais sem estima, com destino ao abandono O cachorro cresceu e passou a ser um estorvo Remorsos infelizmente não nos tiram o sono Esquecemos a merda que somos, amanhã é um dia novo Refrão 2x A música em geral está pela hora da morte Toda a gente a consome, mas ninguém a absorve Já não se escuta nada com a calma necessária Ela tornou-se plástica, tipo comida rápida Mastiga, deita fora, a reacção é inglória 3 minutos de atenção e já passaste à história 3 mil músicas num dispositivo portátil 3 segundos em cada uma, tipo viciados em zapping Não passamos de virtuais coleccionadores Raptores em downloads sem respeito por criadores Memória cheia nos computadores enquanto a nossa está vazia Défice de atenção, mente hiperactiva Nós queremos tudo, mas, no fundo, nada temos Porque, em nada, realmente nos envolvemos São os tempos que correm à velocidade de um sprint Ainda me estás a ouvir ou já passaste pá seguinte Refrão 2x
7.
6a feira, fim da tarde e eu cansado de trabalhar Tinha feito tantos kms, nem me apetecia levantar O telefone começa a tocar, é o Cake a ligar Com a típica e normal proposta para jantar "É em casa do Sérgio, vai lá a maltinha toda Traz um vinho jeitoso para fazermos a real boda" “Combinado!” Escolho o vinho, pego no carro E no caminho a pensar: "Vou ficar num lindo estado!" Mal chego, as minis já rolam como aperitivo Cheira a tarolo, tiro duas, já me sinto mais tranquilo Mais 3 ou 4 cucas, os olhos ficam em bico O jantar tá na mesa e o vinho é convidativo Conversa puxa conversa, copo puxa copo Molho a palavra para discutir o próximo tópico Política, educação, economia e sociedade Já sinto o soro da verdade a falar com intensidade Sobremesas? Não! Sou amigo do digestivo O Sérgio sabe disso e tem uma garrafa sem logótipo "Este é do lavrador, de Santa Cona do Assobio" “Ui! Chega me já um balão que eu chamo lhe já um figo” A conversa anima, a gargalhada já é bem-vinda E já sinto dificuldades na locomoção da minha língua 2 da manhã, a boa disposição já me governa Mas sigo para ir embora, tenho a mulher à espera Refrão 2x: Se vais beber um copo, para quê levar o bote? Eles andam à caça, tens pasta em stock? Não vale a pena, pois a pena é pesada Faz te ao passeio, não te faças à estrada "Ei ó Nocas tem cuidado, tas fixe para levar o carro?" “Tá descansado, que eu manjo onde é que a moina tem parado Já faço isto há 10 anos e nunca fui apanhado Até logo, valeu! Fiquem bem e obrigado” Desço o prédio rápido, conduzir tocado, eu adoro Desço as janelas ao máximo, cigarro e sonoro Sigo tranquilo, as rimas que ouço, sei decor Mas distraído, viro para uma rua que não é a melhor A minha alma congela, a minha cara fica pálida A 100 metros tenho a polícia com um corte na estrada Eu nem reajo, o moina já me faz sinais como um louco “Tranquilo, vamos lá, que isto deve acusar pouco” Paro o carro, o nervosismo abana me como um sismo Sinto a moca no seu pico, penso pra mim, “tou fodido” Saio a cambalear, o moina já se tá a grizar "Boa noite sr condutor, vamos ali soprar?" A caminho do balão eu ponho me a pensar “Fodasse, vou ser despedido, preciso da carta para trabalhar” 1o sopro com receio para atenuar o rastreio "Ó Sr Tiago isto tem que ser feito com o pulmão cheio" 2 vez, sem frete faço aquilo que me compete Na máquina aparece 1.97 “Deixe aí o seu carro, vem connosco para a esquadra” Cai me tudo num segundo, a minha vida está desgraçada Refrão 2x Já no ninho da bófia, eu não consigo encontrar forma Da minha mente ficar sóbria, a puta da língua só se enrola Eles preenchem a papelada, eu já nem digo nada Vou mas é ligar ao Paulinho para ver se ele me leva a casa "Fodasse ó Nocas eu já te tinha avisado" “Pois eu sei bro, para a próxima não hesites, dá me um estalo” Mal desligo, dão me a convocatória pó tribunal "2a feira apresente se lá e tente ser pontual" “Ó sr guarda, o que acha? Acha que ainda me safo?” "Ó Sr Tiago, isso depende do juiz que trate do seu caso Refira que precisa da carta pó seu trabalho Pode ser que fique com ela e que seja só multado" Fim-de-semana estranho, um autêntico pesadelo Dominado pela depressão, ansiedade e o medo Qual seria a decisão do juiz? O meu patrão perdoaria esta merda que eu fiz? 2a feira no tribunal, aproxima se uma senhora Doutora juíza com aspecto de professora “Bom dia Sr. Tiago, isto tá complicado Já sei que necessita da carta pó seu trabalho Mas o seu nível de álcool era demasiado elevado Por isso durante 3 meses não pode andar encartado” Um arrepio percorre-me a espinha e nem avisa Suores frios, quase desmaio à frente da juíza “Agora, preciso que você tome aqui uma decisão Pagar 500 euros é a primeira opção Ou então faz uma doação de metade a uma instituição E participa semanalmente num curso de formação” Escolho a segunda, saio estarrecido e sem chão Vou pó trabalho, de autocarro, para falar com o meu patrão Chego ao seu gabinete e conto-lhe o sucedido Mas no final da conversa, ele parece me tranquilo “Não te preocupes Tiago, eu já passei por isso Precisas de um motorista para andar sempre contigo” Chama o rapaz do armazém e explica-lhe a situação E este todo contente com a sua nova função Em jeito de conclusão e a partir desse dia Tomei uma decisão que até hoje tento seguir à risca Se for para sair, conviver e beber Vou de autocarro, de táxi ou ponho os pés a mexer Refrão 2x
8.
1867, data do seu berço Um livro controverso catalisou o seu começo Contexto temporal, pós revolução industrial Crescimento exponencial da desigualdade social Êxodo rural, concentração populacional Miséria salarial, exploração laboral Ela foi o santo graal para milhões de oprimidos Analfabetos submissos, pelo trabalho embrutecidos Nela viram um motivo para sonhar e acreditar Que era possível alcançar uma sociedade exemplar Irredutível na defesa da dignidade humana Onde a procura da felicidade se tornaria soberana A mais pura esperança nos olhos de uma criança Por não ver o seu futuro trespassado pela ganância A natural ânsia por equidade e justiça Essencialmente espiritual, ela vai além da política Ainda está presente em quem a sente Gente altruísta, benevolente, com o bem comum em mente Cooperação, entre ajuda Dar tudo pelo próximo mesmo que a relação não seja mútua Nobre conduta de luta e resistência Perante a avareza, a tendência egocêntrica Do capitalismo, a sobrevivência do mais forte Ela é o suporte dum cidadão abandonado à sua sorte A luz no fundo do túnel, por trás da locomotiva Ela não é individualista, a sua mística é colectiva Sem a ridícula obsessão materialista Proporcionar o essencial de uma forma gratuita Saúde, educação, habitação e energia Devolvidas a quem cultiva as sementes da economia Tu imagina o que seria um outro modo de vida Se a diária subsistência já estivesse garantida Mas ela foi difamada, apelidada de utopia Raptada por ditaduras com a sua simbologia Envenenada pela cobiça e oportunismo Gente sem o mínimo sentido de compaixão e humanismo E assim chegamos a isto, somos plástico no lixo Talvez seja um eufemismo, mas é aquilo que eu sinto Cegos, entretidos, à espera do paraíso Num inferno sem progresso e desprovido de espírito Refão 2x Tempos sombrios, o egoísmo governa A simbiose fraterna perdeu-se nesta nova era Cada um por si, sem compaixão nem empatia É o resultado de uma esquerda esquecida Spoken word: Sim filho…palavras sábias as tuas Tu és meu filho Mas eu…Sou o filho órfão De uma liberdade conquistada Que não serviu de nada Eu sou o filho órfão De uma esquerda esquecida Que não me deu a vida Não sou homem de qualquer fé E renego a falta de paixão Eu pertenço aos que vivem de pé E não aos de joelhos no chão Sou o irmão solidário Dos que fazem esse futuro Do viver e do ar mais puro Mas sou o pai confiante De uma orgulhosa herança Onde deposito toda a esperança
9.
Como sempre e desde sempre tudo tende a degradar-se O rap luso adaptou-se às regras da sociedade Virou tuga, virou thug, virou guna no desenrasque E como a pasta entrou em jogo, todos querem a sua parte Sacrificou-se a arte, a criatividade A originalidade pela tendência que mais bate Lentamente isto vai ficando vazio, sem conteúdo Sinceramente, com aquilo que ouço, mais vale um gajo ficar surdo Anda tudo com a auto estima muito em cima Será impressão minha ou isso cheira-me a cocaína Pimps e players, dealers e playboys A enaltecerem grandes fezadas, negócios e constróis Cowboys, heróis armados em machões Com ambições de grandes carros e danças em varões É só imitações e o sucesso é garantido Mas o discurso é tão baixo que eu tenho que ficar fodido Refrao 2x: O conteúdo anda uma bosta, mas quem é que se importa Do mais novo ao mais cota, anda tudo atrás da nota Sinto a revolta, mas na volta estou sozinho Diz-me lá, ando a bater no ceguinho? Mais um rapper que ficou rico, outro que tenciona sê-lo Quem não os sente por algum motivo, é porque tem dor de cotovelo A sério? Que degredo, nem tudo anda atrás do mesmo Há quem ainda faça isto só pelo prazer em fazê-lo Será que colaste um selo? Não tens mai nada para falar Ok, já percebi adoras beber e fumar Eles põem me com medo, são uns ases no engate Se calhar é melhor fechar a minha mulher a 7 chaves Mais um hit para a street mas estão em casa no Facebook Só saem pó videoclip com o outfit e cara de rude São um êxito no YouTube, mas o conteúdo tá muito aquém “Rest in piças” às pitas adolescentes que te seguem Como te falta sumo, viraste pró nos adlibs Tá tudo, mas isso aqui não passam de paneleirices É só fogo-de-artifício, a mensagem tá na miséria Esquecida, boicotada e a ignorância prolifera Refrão 2x O rap interventivo está em coma induzido Agora parece proibido deixar um ouvinte pensativo Eles querem-te submisso, entretido e morto-vivo Carneiro do materialismo sem um estímulo cognitivo Isto anda fodido e não é de agora Desde que virou moda, pouca gera da minha era o suporta O que era praticamente uma terapia de auto-ajuda Virou mera prescrição de medicação na consulta Eles agora são meros actores com um guião Com uma fórmula estereotipada sem imaginação Enchem linham com chouriços, dão enfoque no refrão Cheio de feitos para agradar o ouvido da multidão Eles estão numas de expansão e o tema é recorrente Desejo-te tudo de bom desde que dês algo prá mente A vida é muito mais do que festas, mocas e pasta Esse paleio sem conteúdo não sacia a minha traça Refrão 4x
10.
Paternidade 04:10
Nada na verdade se compara à paternidade A emoção, a angústia, a responsabilidade A vida muda, sem dúvida a partir do momento Que tens um rebento a precisar do teu amor e sustento O nascimento é algo mágico, divino, sobrenatural Segurar nos braços um recém-nascido? Não há igual E é aqui que tudo se altera porque nada supera Esta quimera de ver uma vida na sua bela Primavera A crescer, a florescer, cada dia é uma novidade O sorrir, o palrar, o gargalhar com espontaneidade A primeira palavra, o primeiro raciocínio O fascínio de cada degrau num processo contínuo Os primeiros passos e galos consequentes Desenvolver um sexto sentido para evitar acidentes O descanso é raro num quotidiano rotineiro Isto não é um passatempo, é um ofício a tempo inteiro Refrao 2x: Não há nada como ser pai, o sentimento é mágico Aproveita cada momento pois o tempo passa rápido Apesar do cansaço, todo o esforço vale a pena A presença de uma criança na tua vida é recompensa As fraldas, o leite, a chupeta, as cólicas A creche, os medos, a comida, o deitar cedo O choro, as birras, o sono, os pesadelos As quinas, as quedas, as negras, os brinquedos Há quem diga que os filhos dão novo alento a uma relação Tá bem... Diz me lá onde é que tu viste isso então Com uma prole e um horário de trabalho de sol a sol É natural que o novelo da paixão não desenrole Tão facilmente como antigamente, a chama não se acende? Tem calma! É o cansaço que te deixa impaciente Talvez mais intolerante mas tudo tem o seu tempo E se filhos são prioridade, aproveita este momento O sentimento de exaustão faz parte, não há escape Tens a obrigação de lhes dar a tua vitalidade Noites mal dormidas, caos nas refeições Conforma te porque para isso não existem soluções E apesar do desgaste, isto vale bem a pena Se este milagre da vida te cumprimenta, então acena De volta, porque eles crescem e ficas descansado É treta, filhos criados, trabalhos dobrados Refrão 2x As fraldas, o leite, a chupeta, as cólicas A creche, os medos, a comida, o deitar cedo O choro, as birras, o sono, os pesadelos As quinas, as quedas, as negras, os brinquedos Educar uma criança tem tanto que se lhe diga A incerteza da melhor conduta é a constante que nos pisa Qual é o ponto em que os mimos deixam de ter benefícios? E devemos passar a ser severos e assertivos Uma criança é junção de genética e educação O comportamento não cai do céu, é reacção da tua acção Este é o verdadeiro peso da responsabilidade Que nos dá brancas e rugas em tão tenra idade Mas na verdade, a vida ganha outra cor, outro sabor Só quem é progenitor sente a intensidade deste amor Entrega completa e sincera de corpo e alma Sem pausa, nem ressalvas e sem salva de palmas Coração aberto e um caminho concreto Dar tudo pelos filhos porque já nem eu próprio interesso Quando és pai, o egocentrismo deixa de ter sentido E qualquer sacrifício é feito por um justo motivo Refrão 2x As fraldas, o leite, a chupeta, as cólicas A creche, os medos, a comida, o deitar cedo O choro, as birras, o sono, os pesadelos As quinas, as quedas, as negras, os brinquedos
11.
Muito bom dia. Quê? Muito bom dia o caralho Eu estou fodido e mal pago, em pânico, angustiado Eu vivo no futuro, em 2054 Onde já nada é público, tudo passou a ser privado Trabalho como um escravo sem direitos nem contrato Com um sistema de produção quase todo robotizado Tenho andado preocupado, corre um boato lá na fábrica “Ouvi dizer que o patrão quer comprar mais uma máquina” Estou casado, cachopo com seis anos na escola E uma propina que quase me põe a pedir esmola A minha mulher trabalha atrás de uma secretária Até aqui menos mal, mas ela encontra-se grávida 38 semanas, já começaram as contracções Mais um filho para alimentar e eu sem condições! Eu disse filho? Nem sei se é menino ou menina Nem guita tive para nenhuma consulta de obstetrícia Será que é saudável? Posso-lhe dar conforto? Eu queria, mas não havia pasta para um aborto As contracções aceleram, siga pá maternidade Eu vou pó trabalho ou sou despedido por falta de assiduidade Só que a maternidade é mais cara do que um hotel Ambulância, parto, estadia... Eu preciso de papel Vou ligar pó banco, vou pedir um financiamento Se ela for pa cesariana ou se ficar lá muito tempo Deixo o puto na escola e mal chego ao trabalho No cacifo, um recado, reunião com o patronato A caminho, reparo, no meu espaço há um reboliço É a nova geringonça a fazer o meu serviço Tou fodido, sigo pá reunião com cara de derrotado O gerente com paleio de saco e discurso ensaiado Reestruturação na empresa, cortes na produção Sou dispensado com frieza sem qualquer compensação É que nos tempos que correm já não há subsídios Trabalhadores são despedidos com direito ao suicídio Chamada no telefone, é da escola do meu filho Sinais de gastroenterite, sigo em seu auxílio Chego lá “fodasse, o puto tá mesmo mal” Eu sou aconselhado a dirigir-me a um hospital Ok, tá mais que visto que eu hoje vou à falência Nova chamada no telefone mal chego à urgência A minha mulher, diz que a situação tá complicada Tem que ir pa cesariana pois a bebé tá sentada “O quê? É uma menina? Mas que boa notícia!” Por momentos até me esqueço de quanto custa a cirurgia O meu filho é atendido e o remédio é prescrito Consulta paga, conta passa logo a negativo Tou literalmente fodido, o que é que hei de fazer? Amanhã nem pasta para fraldas eu vou ter
12.
Tu és a minha heroína, sempre foste e sempre serás Mãe galinha, anjo da guarda, nem preciso de olhar para trás Eu sei que estarás lá para aquilo que for preciso Com um sorriso digo que tenho orgulho em ser o teu único filho Tu és o meu alicerce, a minha tábua de salvação Foi notável a tua dedicação na minha evolução Amor incondicional, exigente na educação Terra-a-terra, simples e laica de profunda convicção Alimentaste o meu coração de respeito pelo próximo Seja ele rico ou pobre, o carácter não vem com rótulo Origem humilde, de onde se sobrevive Sempre grato porque nunca tiveste tudo aquilo que eu tive Sempre fui na realidade a tua prioridade Mas além do conforto, deste me responsabilidade Fidelidade no amor e na amizade Capacidade de lutar por quem nos ama de verdade Refrão 2x: Este olhar que eu trago é reflexo de ti Vivo a dar o que deste porque eu não me esqueci E se o fardo vier, eu só paro no fim Não vou a nenhum lado, vê se esperas por mim Tu és o meu herói, sempre foste e sempre serás Pai dedicado, inteligente e perspicaz Eterno motor de busca de conhecimento e cultura Apresentaste-me bem cedo a música e literatura Teatro, cinema, sempre foste um erudito Ensinaste-me que é na arte que se cultiva o espírito Tu estás a ver o que o teu filho está a fazer? Aquela poesia que sempre gostaste de escrever Sou o teu legado, acho que podes estar descansado Inconformismo na sociedade e empenho no trabalho O gosto pelo desporto, a alquimia da forma física Somos fotocópia genética nos gestos e na mímica Nos últimos 15 anos, tens andado emigrado Não há palavras que descrevam o quanto te tens sacrificado Mas apesar da distância, tu manténs-te chegado A preencher este vazio que nos tem assombrado Refrão 3x
13.
A caminho dos 40, quem é que ainda me aguenta? A maioria desses ouvintes ainda estão na placenta Mantenho a relevância? Tocarei na tua essência? O que digo tem importância? Ou sou mais um sem audiência Estarei a perder o meu tempo? Vale a pena continuar? Entre o trabalho e a família, talvez eu deva sossegar Acalmar, desfrutar da vida sem pensar tanto Sem questionar tanta coisa e permanecer no meu canto Mas não! Ainda tenho alento e coração Continuo com algo a dizer mesmo sem aprovação O tempo é restrito mas eu cá me desenrasco Tenho um pacto com isto e persisto em honrá-lo A tua opinião é brisa na minha cortina de aço Não mudo os meus princípios porque a música tem mudado Aquilo que me move não são as modas do mercado Quando partir, talvez me consideres um achado Refrão 2x: Ainda devo fazer isto? Estarei ultrapassado? Talvez, mas esta música deixa-me viciado Viver por viver, sem rimar não faz sentido Eu continuo aqui, improvável e atípico 3/4 da minha geração já não fazem som Eu questiono, eles afirmam que já não têm inspiração Que já não têm tempo, vontade ou motivação E eu penso, afinal como é que eu me aguento aqui então? Devo seguir o exemplo? Já que isto não dá sustento? E quando quase ninguém anda nisto pelo sentimento? Será que isto que faço pertencerá ao passado? E como passado que seja, devo arruma lo no armário? Não! A música faz parte de mim Eu sinto me mais no início do que propriamente no fim A idade não é um posto, muito menos um obstáculo Eu provo isso todos os dias a quem me disser o contrário Estou motivado, ainda mais do que quando era chavalo Na verdade, a maturidade só me tem ajudado Vidrado no ritmo, viciado na poesia Deixar isto abandonado? Ainda há-de chegar o dia Refrão 2x Tá mais que visto e revisto que eu não me identifico Com certas tendências que a maioria tem seguido Será que não me actualizo tipo sistema operativo? Serei velho do Restelo anti tudo que seja progressivo? Andarei realmente só a bater no ceguinho? Será que o rap ganhou asas e eu, à procura do ninho? Será que o conteúdo consciente perdeu se no seu caminho? Será que estarei nesta luta realmente sozinho? Não! Eu sei que não! Ainda há gente boa de ouvido Aquela minoria do costume que está aqui desde o início É para vocês que eu rimo, aqueles que sentem o que eu sinto É não se deixam hipnotizar por algo que só tem brilho O trajecto do progresso às vezes tem retrocesso E nem tudo o que é novo nos traz algo de concreto Eu continuo fiel àquilo que me apaixonei Mensagem pura e Boom Bap tal como manda a lei Refrão 2x

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released April 25, 2018

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